
No universo da série “Umbigo do Mundo” (escrita por mim e ilustrada pelo Penim Loureiro, ainda por lançar) somos atirados para a lenta senescência da Humanidade, que nem lemingues, avança cegamente para o seu fim.
O apocalipse, o evento terminal da humanidade como civilização, é um tema mais que explorado na ficção.
Seja ele trazido por zombies, invasões alienígenas, pandemias, hegemonia da inteligência artificial ou pelas alterações climáticas, estas histórias são um reflexo das preocupações prementes da sociedade, funcionando como uma grande sessão de psicoterapia de grupo, que nos prepara para as tribulações que prevemos para o futuro.
Ironicamente, apesar de todo o progresso científico e político, a ficção é ainda quem apresenta as reflexões mais sérias acerca dos piores cenários possíveis.
A civilização é um longo diálogo com o futuro, passado de geração em geração, por vezes interrompido, mas sempre retomado.
O apocalipse obriga-nos a pensar nas nossas últimas palavras enquanto civilização, que epitáfio queremos deixar na nossa campa.
As personagens de “Alma Mãe” vivem num mundo assolado por uma pandemia lenta, que põe lado a lado o cadáver da civilização e a vida das pessoas comuns que sobrevive, gerindo a vida dia-a-dia, numa posição de ignorância auto-imposta ao estilo “não-digas-não-perguntes” ao que futuro irá trazer.
Ao longo do 1º álbum da série Umbigo do Mundo é oferecida como possibilidade que o último estertor civilizacional seja a arte, quer através da arquitectura, quer através dos ícones religiosos e da cultura pop. No fim, é a arte o nosso legado como civilização.
E, em tempos de quarentena real, não deixa de ser curioso de notar que é na arte, muitas vezes chamada de inútil e secundária, que a sociedade foi procurar abrigo. E, talvez, de uma estranha maneira, face ao fim, a arte apresenta-se como algo pelo qual lutar.
Citando James Oppenheim:
“Sim, é Pão pelo qual lutamos – mas lutamos também por rosas”
Carlos Silva